domingo, 30 de setembro de 2012

CARAMUJO E FLOR














Esguia-se sobre a terra.
Busca veredas e puros perfumes
Transita arredio e irreal
Captam suas antenas um pulsar astuto,
figura cor em flor de outono
 
 
Rasteja esquálido, rastreando o jardim
Encontra a pétala em fogo
Volta-se ao mar, seu formal reduto
Porém, não deseja a brisa;
arde descobrir a térrea firmeza
 
 
Descortina a carapaça,
Desnuda segredos,
Perfaz o rastro
No vaso, em brasa,
a pétala convida seu errante
 
 
Sauda a manhã,
Entorpece as cores,
Degusta a pétala,
Queima receios:
- O mar e a terra invadiram-se sem culpa...
 
 
 
NOTA DO AUTOR:
 
 
O caramujo-gigante é oriundo da África. Seu nome biológico é Achatina fulica. Este molusco pode pesar 200 gramas e medir cerca de 10 centímetros de comprimento por 20 centímetros de altura.
 
Sua concha é de cor escura, com manchas claras, alongada e cônica. Foi introduzido ilegalmente no Brasil na década de 80, no Paraná, para substituir o escargot. Como não foi bem aceito entre os consumidores, e proibido pelo IBAMA, muitos dos seus criadores, displicentemente, liberaram os caramujos na Natureza.
 
Para a sua manipulação é necessário o uso de luvas ou sacolas plásticas, e cozê-lo antes de comer a sua carne. 
 
Sem predadores naturais e com procriação rápida, sendo um único caramujo capaz de procriar até 300 crias por ano, este caramujo alimenta-se vorazmente de qualquer tipo de vegetação. É também hospedeiro de duas espécies de vermes que podem causar doenças intestinais e encefálicas.
 
Por outro lado, alguns pesquisadores ressaltam o potencial desta espécie de caramujo para o desenvolvimento de produtos cosméticos e fármacos, que podem combater a leishmaniose. Se bem preparados, para alimentação, possuem alto valor de proteína.
 
Estas informações são da bióloga Mariana Araguaia, especialista em Educação Ambiental, e membro da equipe do "Brasil Escola".
 
Sob o ponto de vista do texto literário, o caramujo representa o indesejado, o rejeitado, o anômalo.
 
A flor, sua pétala, significa a singela, delicada e desejada beleza - atrativa e bem aceita.
 
O encontro de ambos aponta para a possível reconciliação, presente na Natureza, entre polos que se encontram para recriar a vida, em novos estágios de evolução, outrora desconhecidos.
 
Entre o anômalo e o aceitável há o inominável.
 
 

domingo, 23 de setembro de 2012

PEDIDO AOS CONFRADES







Faz-se urgente atitudes nobres
Sinceras, belas palavras
Canto, sorriso,
e abraço apertado
 
 
Faz-se urgente a união
de mãos distantes
Um bailado inocente, a alegria febril
Calar canhões, e cegar olhares esguios
 
 
Faz-se urgente o brilho das cores
Semear novas mentes
Pássaros, sol e lua
Transitar entre nuvens com pernas longas
 
 
Faz-se urgente:
Ser,
Humano,
Engendrar sementes...
 
 


NOTA DO AUTOR:
 
Retomar genuínos valores humanos: nobreza, sinceridade, beleza, boas palavras.
Apreciar um canto, um sorriso, um abraço, sem medo de parecer antiquado.
Unir mãos, bailar com inocência, ter prazer em sentir alegria.
Dizer, não! Às guerras, a fome, a miséria, amarguras, intrigas e más palavras.
Dizer, sim! Ao ser, ao humano, ao conhecimento, ao aprendizado.
Sentir-se parte da natureza, da criação: "Pássaros, sol e lua..."
Urgência... em semear um novo amanhã.


domingo, 16 de setembro de 2012

POEMA TALHADO















Na pedra afio ferramentas,
Na pedra conheço aspereza,
Na pedra edifico fortaleza,
Na pedra tombo duro lapidar


No balanço das marés,
lá está:
inconfundível, imperturbável
Se o fogo ameaça,
lá está:
intransponível, imensurável


Na pedra consolido o presente,
Na pedra afirmo ideais,
Na pedra educo desejos,
Na pedra planto flores de concreto




NOTA DO AUTOR:


A firmeza como manifestação de resistência. Talhada, esculpida e moldada renova-se para permanecer.
Contrapõe-se à frágil maleabilidade disfarçada de conveniência.
Não cabe ao homem negar sua origem, suas raízes, sob pena de adulterar-se, tornando-se uma caricatura, uma máscara reduzida a mera performance.
A voz texto não apoia nenhum tipo de intolerância, pois esta é também uma oculta forma de esconderijo, de disfarce.
A pedra simboliza o ser no estado original da sua verdade. 

domingo, 9 de setembro de 2012

O MAR E O VISITANTE















Repousa os pés à beira-mar
Lança procura à dança das águas
Deserta tarde, o sopro da concha
Celeste imagem
apresenta-se vaidosa ao espelho anil
 
 
Lívida pedra, pedra de encosto
Pétala-rosa,
acariciada pelo confuso visitante
Unge cicatrizes, água matriarca
Musgo, alga, lama acumulada
 
 
São peixes respirando tal ardor
Sereia, deusa serpente, recorda a beleza ostensiva
Retêm o espanto,
alhures afoga o sarcasmo
Despede-se: beijando o mar em lágrimas  




NOTA DO AUTOR:
 
A introspecção como recurso de autodescobrimento.
Este é o tema recorrente dos símbolos dispostos no texto acima.
O mar remete a consciência imersa em memórias e sensações.
O visitante é a persona do texto, que transita entre os símbolos, na busca de entendimento e definição.
A integração do mar (consciência) com o visitante (persona) sintetiza-se exposta no verso final: "Despede-se: beijando o mar em lágrimas".




domingo, 2 de setembro de 2012

ELEGIA AO DESENCONTRO















Versos percorrem a melodia
qual anjos decaídos são traçados
Compondo ou similar, divago
Observo às ruas ao acaso
 
 
São versos ornamentados,
textura solúvel transitória
Recolho impressões de horas solitárias
Retalho a fina carne no poema entranhada
 
 
Sensoriais figurações
ocultam o ocaso
Derradeiras confissões:
complexa-reflexa aversão ao marasmo
 
 
Embalo solene a canção perdida
contrapondo-a exalto a perene vida
Retomo na lira a elegia sentida
Derrubando altares: ressalto verdades esquecidas



NOTA DO AUTOR:
 
Metalinguagem. O texto trata sobre impressões subjetivas do ato de escrever em versos, compor, reunir palavras, trabalhar sonoridades, intuir a melodia interna da escrita no momento da criação. Um mundo à parte que se consolida na necessidade de manifestar pensamentos e sensações em linguagem lírica, expondo conteúdos inconscientes e vontades reflexas.
 
Escrever é um exercício de autoencontro.