domingo, 24 de junho de 2012

VAGO ANDOR



                                                      Fotografia: Vanessa Cavalcante



Esta apreensão que corrói as entranhas
Esta inquietação que me traz de volta do sonho
A desmedida vontade de recriar
desejos impulsionantes...
Entraves torturantes!
Afasta-te de mim!
Nefasto amargor!


Ah, dor d'alma,
bendita seja!
Razão real da maturidade fraternal
Esteja em guarda,
vigília constante, anjo da dor
Missionários desencadeiam os benefícios da prece
Irradiam luzes em abundantes benesses


Enxugue, com incessante fulgor,
o pranto do recolhimento austero... estanque
Sabor expiatório do cálice (cale-se) apaziguador
do vinho banhado em sangue edificante
O jugo é leve e o manto aconchega
Ah, dor d'alma,
bendita seja!





NOTA DO AUTOR:
Apreensão, entranhas, inquietação, sonho, vontade, desejo, entraves, amargor, dor, alma, maturidade, vigília, anjo, prece, benesses, pranto, sabor, cálice, vinho, sangue, jugo e manto são todos substantivos presentes e representativos da atmosfera deste texto, com clara conotação de conflito existencialista: busca de libertação e pedido de auxílio à forças superiores para superar uma extremada angústia.
A dor é qualificada como algoz e benfeitor. O que causa sofrimento também ensina, alerta e serve de agente renovador da alma aflita.
A voz textual entrega-se a uma espécie de resignação construtiva: o consentimento da razão.


domingo, 17 de junho de 2012

SARAU DE UM SARCASMO











Fere a baioneta do tempo,
implacável conselheiro:
reduzindo-nos à medida desmascarada;
transparência visível
Impõem-se as generosas asas de um anjo familiar,
com altivez,
envolvendo-nos em salutar
lucidez


Contemporâneo movimento
refletido no encadeamento das realizações
Amor materno,
serafins,
afins,
libertadora verdade
As correntes aprisionam o fruto venal
de erratas incoerências


Fatalidade sentencial,
onírico real
O tom lúdico da comédia vida
mostra-nos o desejo representado pela vontade
O arbítrio condensa o poema
Fonte inconteste para o entendimento:
Cântaro transborda,
transporta indagações...


NOTA DO AUTOR:

Até que ponto decidimos de fato sobre o rumo de nossas vidas?
Esta é a pergunta oculta em torno dos versos acima que apontam em curtas sentenças, pareceres esparsos, em proposital desconexão, para formar um corpo textual que indica um diálogo interno sobre a busca de uma possível conciliação entre o tempo, que transcorre impondo-nos decisões, e o uso de nosso arbítrio, para eleger caminhos e assumir responsabilidades.
Roda Viva de sentimentos e emoções... 

domingo, 10 de junho de 2012

JARDIM DA LUZ















Por entre as oliveiras ouviu-se um grito
Era o grito da menina
que tropeçara e caira da escada que a levara ao portal
O fruto fora esmagado
pelos pés firmes dos passantes

Os pássaros com asas quebradas
aterrizavam razantes,
no chafariz mergulhavam,
enroscando-se no lodo ocasionado
pelas impurezas por ali atiradas

Aqueles que não aterrizavam,
escondidos cantavam,
ocultos pela folhagem
das poucas altas árvores
que restavam 

As flores sorriam
(mais por convenção do que por vontade própria),
temiam as mãos dos transeuntes irresponsáveis
que, sem cerimônia, teimavam 
em arrancá-las

Senhoras, senhores, crianças, moças e rapazes
divertiam-se nos arrebaldes, encantados com a beleza presenciada
Apenas não notaram o suspiro aliviado dos ilustres moradores,
quando os portões foram fechados,
e a paz retornou, enfim, a morada


NOTA DO AUTOR:

Contrastes: presença humana x paisagem natural.
O que deveria indicar equilíbrio e integração, nesta relação do homem com a natureza, tornou-se por imprudência do homem, ameaça ao meio ambiente.
Quando não imbuídos da ideia de sustentabilidade no contato com os recursos naturais, dispostos para o nosso benefício, afrontamos, agredimos, secamos esta fonte de vida e exuberância que é a natureza.
Refletir em torno da postura humana diante dos demais reinos da criação, este o objetivo do texto acima. Alertar sobre o fato de que o planeta é um macro organismo, cuja saúde depende do zelo que devemos ter com cada um dos seus elementos.

domingo, 3 de junho de 2012

PRECE AO PENSAMENTO











Abrandai os tormentos herdados
de minhas imperfeições
Qualificai o instante sagrado de estar a sós
em consciência
Trazei a vida aos olhos cansados
da lida expiatória
Sois mais do que parte integrante,
és o permanente instante...


Gritai aos quatro cantos
contra a perfídia do algoz
Não esqueçais, porém, que o algoz
não é mais do que o atroz
que estais em vós
Transcendei como o vento
que consigo carrega aurora nova:
renovo pensamento


És o deus capaz de impulsionar
os nobres desejos
Em detrimento
às más paixões humanas
Equilibrai a razão
sedenta de úteis esclarecimentos
Pedirei-te apenas que não se distancie da minha prece:
guiando-me, inspirando-me na existência que em mim amanhece...


NOTA DO AUTOR:

O texto acima é um diálogo entre o indivíduo e o pensamento.
Pensamentos não são visíveis até se materializarem por meio de palavras, gestos ou atos. No entanto, sejam nossos ou pensamentos alheios, eles estão a influenciar tudo ao nosso redor.
É, sem dúvida, o principal atributo da individualidade, que não é reproduzido por nenhum outro ser na natureza. É a capacidade de pensar de forma contínua, analisar e avaliar o que está sendo pensado.
A prece no texto funciona com um chamado, uma evocação ao pensamento em sua genuína forma de expressão: o ato de refletir tendo por auxiliar a razão equilibrada.